SIMPLICIDADE E POBREZA- PARTE 2

INTRODUÇÃO 



Este é um tema muito difícil, pois são muitas as interpretações desse assunto na Bíblia.


Atualmente a simplicidade e a pobreza ganharam novas formas de serem vividas, diante da parafernália de veículos de comunicação, entretenimento e trabalho.

Apresento aqui reflexões pessoais sobre esse assunto, baseado na Bíblia, e cada um aplique como puder em sua própria vida. Tudo o que é radical e exagerado não é aconselhável. Um dos problemas que vejo em minha vida e em geral é que perdemos muito tempo com muitas coisas que não são tão necessárias como pensamos que sejam, e deixamos várias outras coisas, essas sim importantes, de lado. 

A correria da vida atual se une às dispersões de tempo com essas coisas desnecessárias de que falei, e acabamos não tendo tempo para a oração, para a família, para um pouco de lazer mais saudável etc. 

Dificilmente alguém consegue viver uma pobreza radical hoje em dia. O próprio Cristo, ao falar aos setenta e dois discípulos que fossem pregar o evangelho despojados de tudo, disse-lhes que aceitassem o que lhe oferecessem como alimento, e entrassem na primeira casa que lhes desse hospedagem. Eis aí a simplicidade: eles não deviam ficar escolhendo a casa que achassem mais bonita, mais limpinha; entretanto, podia acontecer que a primeira casa que os acolhesse fosse uma casa de pessoa abastada...

Espero que as meditações aqui apresentadas ajudem você a revisar a própria vida, mas sem nenhum exagero: simplicidade, para encontrar Deus (Sabedoria 1, 1-5), pobreza para acolher o irmão. 


1 - A SIMPLICIDADE 

O livro “ A Imitação de Cristo”, do século 13, diz no capítulo 18 do livro 4 : “Ó bem-aventurada simplicidade, pela qual deixamos de lado as vãs discussões para andarmos no caminho plano e firme dos mandamentos de Deus!” . . .

Antes dele, o livro da Sabedoria, capítulo 1, versículos de 1 a 5, já flava que os simples conseguem obter a revelação da pessoa de Deus. Ele se revela aos simples e aos que não o põem à prova. 

Simplicidade significa, portanto, antes de tudo, confiar em Deus plenamente, deixando em segundo, terceiro ou mesmo último lugar aquilo que nos dá prepotência sobre os outros, ou uma situação financeira privilegiada, abandonando completamente tudo o que nos pode separar de Deus, tudo o que for supérfluo e secundário . As coisas que não puderem ser renunciadas, não se apegar a elas, porque um dia nos “deixarão na mão”, como o povo fala. (Você pode encontrar o livro " A Imitação de Crito neste site, só bastando clicar: http://www.culturabrasil.org/zip/imitacao.pdf


Quando uma pessoa perde a liberdade de uma forma ou de outra (pela prisão, por exemplo,ou pela doença), tudo, tudo mesmo, o que norteava sua vida muda de lugar em sua escala de valores. Coisas que ocupavam o primeiro lugar de sua atenção passam a lugares mais últimos e vice-versa. 


Mesmo na prisão ou num leito de hospital vemos como as coisas são relativas. Se a pessoa mora num lugar escuro e insalubre, sem higiene, e muda-se para um outro um pouco melhor, parece que entrou no paraíso! O doente, ao sair do hospital para sua casa, acha que ganhou na loteria.


Tudo é relativo e secundário se colocamos como nossa meta principal o Reino de Deus. Dizia São Tomás de Aquino: “É melhor andarmos mancando (claudicando) no caminho certo do que correr no caminho errado, pois só chegaremos ao paraiso se estivermos no caminho certo, estejamos correndo ou mancando”.


Nos sofrimentos e nas dificuldades, nas coisas que tiram a nossa liberdade, como a pobreza extrema, nós nos encontramos com a realidade da vida, nua e crua. As ilusões e as mentiras se desfazem como fumaça. Uma das consequências é que passamos a sentir um tipo de ojeriza por tudo aquilo que não agrada a Deus. Entretanto, antes de “cairmos na real”, ou seja, de percebermos que a vida é curta e é também cheia de surpresas desagradáveis que se alternam com as agradáveis, entramos em crise, nos desesperamos, nos desiludimos, e aí nos restam poucas opções.

A opção que mais nos leva a uma santidade de vida e à felicidade é aceitar o fato de que somos pecadores e considerar sinceramente os próprios pecados, atuais ou passados, incluindo aí tudo o que fizemos de errado ou todo o bem que deixamos de fazer. Em seguida, começarmos uma vida nova, de simplicidade, de confiança ilimitada em Deus, uma vida real, de “pés no chão”, de misericórdia, humildade, confiança, de muito amor, de vigilância e oração.

Quando estamos livres e com saúde, adquirimos necessidades supérfluas, necessitamos de de uma montanha de coisas para viver. Quando ficamos doentes ou sem liberdade, percebemos que não precisamos de nada daquilo. Passamos a viver com bem pouca coisa.


Quantas coisas inúteis e/ou supérfluas vamos agregando ao fardo que levamos às costas! É um fardo pesado, constrangedor, deprimente, cansativo, que nos leva a um enfado, a um descontentamento e a uma aversão ao ritmo que estamos dando a nós mesmos. 


O ser humano só se sacia em Deus e em ninguém mais! O milionário nunca se fartará de dinheiro! O glutão nunca se fartará de comida! O irritadiço nunca se acalmará! Os vícios, o uso doentio das coisas supérfluas, nos levam a uma tristeza conosco mesmos, a um desânimo de viver que muitas vezes conduzem ao suicídio. A paz só vem de Jesus. Só ele pode nos libertar de nós mesmos, de nosso fardo pesado. É Jesus quem nos diz:


“Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos.(...)Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas, porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve”. (Mateus 11,25.28-30).


A simplicidade nos leva a ser pobres em espírito e puros de coração (Mateus 5,1-8). Quando entramos em crise ao nos lembrarmos de quantas coisas no passado deixamos de fazer pelos outros, principalmente pelos nossos pais e pessoas mais achegadas, pelas vezes que não demos testemunho de nossa fé, devemos pedir perdão e gravar em nosso coração como disse S. Paulo: 


“Deus é poderoso para realizar por nós, em tudo, muito além, infinitamente além de tudo o que pedimos ou pensamos”. (Efésios 3,20). 


Essa convicção vai nos tirar da depressão, do estresse, vai nos dar alívio, se nos colocarmos nos braços do Pai, que, poderoso, poderá nos purificar e conduzir a nossa vida por um caminho de confiança e de esperança. 

Se Deus é assim tão poderoso, ele pode também ser todo misericordioso, como diz Jeremias 31,3:

“Eu te amei com um amor eterno; por isso guardo por ti tanta ternura!”

Por isso tenhamos certeza de que ele nunca nos abandonará, se deixarmos que ele tome conta de nossa vida, como diz Isaías 42,16;

“Eu nunca hei de abandoná-los”

E em Isaías 49,15:

“Mesmo que a mãe se esqueça do filho que gerou, ou deixe de amá-lo, eu jamais me esquecerei de ti!”.

Ou ainda em Isaías 66,13:

“Qual mãe que acaricia os filhos, assim também eu vou dar-vos o meu carinho”.

Se estivermos dispostos a deixar os pecados e nos aproximarmos de Deus, ele nos perdoará nossos pecados, conforme lemos em Miqueias 7,19:

“Ele vai nos perdoar de novo! Vai calcar aos pés as nossas faltas e jogará no fundo do mar todos os nossos pecados”.

Se formos inteligentes vamos perceber que a melhor saída, a melhor solução é confiarmos em Deus permanentemente e totalmente! Sta. Teresinha já dizia isso, em palavras parecidas com estas:

“A lebre, ao ser perseguida pelos cães, refugia-se, assustada, nos braços do caçador”.

Eu acho essa frase magnífica! Na crise de desânimo, de enfado, de repugnância por tudo, e às vezes até por nós mesmos, precisamos e podemos, para nos livrar de um Deus-Juiz, nos refugiarmos e pedirmos ajuda no Deus Salvador e misericordioso”. Vendo que não há outra saída, ou seja, que não dá para nos livrar do perigo, refugiemo-nos nas mãos do próprio Juiz enquanto estamos vivos e nesta terra! Enquanto estivermos por aqui, ele não é juiz: ele é salvador. 


Um modo bem prático de fazer isso é colocar diante dele todo o nosso passado, mudando a direção de nossa história para uma meta mais santa, ou seja, em direção ao paraíso, e obteremos novamente a paz para a nossa vida.


2 - A POBREZA 

A simplicidade só é possível se acreditarmos que Deus está presente ininterruptamente em nossa vida, e por isso não corremos feito doidos atrás do dinheiro, como diz Hebreus 13,5-6:

“Que o amor ao dinheiro não inspire a vossa conduta. Contentai-vos com o que tendes, porque ele próprio disse: 'Eu nunca te deixarei, jamais te abandonarei'. De modo que podemos dizer com ousadia; 'O Sr. é meu auxilio, jamais temerei; que poderá fazer-me o homem?”


Se amamos o dinheiro sobre todas as coisas, nunca viveremos a simplicidade, o amor gratuito e generoso a Deus e, consequentemente, às pessoas. Sabendo que Deus nunca nos abandonará, como vimos nesses trechos àcima, vamos viver uma gostosa despreocupação pelo que vai nos acontecer. Seja o que for que nos aconteça, Deus está presente e vigiará para que tudo saia bem, embora por agora pareça tudo esquisito e tormentoso. Nunca estamos sozinhos, se estivermos confiantes em nosso Criador e Salvador. É Mateus 6,19-34 que nos diz isso, culminando com os versículos 33 e 34:


“Buscai, pois, em primeiro lugar, o reino de Deus e sua justiça, e todas essas coisas vos serâo dadas em acréscimo. Não vos preocupeis com o dia de amanhã. O dia de amanhã terá suas próprias dificuldades. A cada dia basta o seu fardo”.


Mesmo na evangelização buscaremos os meios pobres, os meios mais simples, se confiamos em Deus, como fazem os que seguem a espiritualidade do Beato Carlos de Foucauld, cujos escritos você encontra neste mesmo blog, no índice. Muita parafernália na evangelização acaba impedindo, podemos dizer assim, a ação do Espírito Santo. Quando S. Paulo Apóstolo falou no areópago de Atenas, usou a sabedoria e depois se arrependeu disso. Dali em diante, procurou pregar mais com a inspiração e a ajuda de Deus do que com os recursos de sua ciência. 

Dizia o beato Carlos de Foucauld que devemos não apenas proclamar, mas “Gritar o evangelho com a própria vida”. S. Paulo Apóstolo percebeu isso como ninguém, ao dizer que “Quando sou fraco, aí é que sou forte” (2ª Cor. 12,10). E é isso mesmo, pois se eu me acho forte, vou fazer tudo por mim mesmo, sem depender muito da ajuda de Deus; entretanto, se eu admitir minha fraqueza, vou confiar e pedir a ajuda divina, e Ele me ajudará. O salmo 126(127) é bastante esclarecedor nesse assunto, quando diz:


“Se o Senhor não construir a casa, é em vão que os construtores trabalham”. E ainda Mateus 12,30: “Quem não está comigo, está contra mim; e quem não recolhe comigo, espalha”. Por isso, a coisa mais inteligente que podemos fazer é pedir a ajuda de Deus e nunca agir confiando em nossas próprias forças!


No Antigo Testamento temos muitos exemplos disso que estou falando: quando o povo confiava na ajuda de Deus, vencia a batalha; quando confiava apenas nas proprias forças, perdia. Confira, se quiser, estas passagens: 


Davi e Golias (1ªSamuel 17,50-51);

Sansão e os filisteus (Juízes 16,28-29);

A queda dos muros de Jericó (Hebreus 11,30 e Josué 6,14-20);

Gideão vence com 300 homens, depois de escolher entre 32 mil (Juizes 7,7);

Já no Novo Testamento temos a parábola do homem que teve de pensar antes de começar a casa e que não iria conseguir terminar, em Lucas 14,28-33, incluindo a parábola do rei que devia checar se conseguia vencer o inimigo com o seu exército ou não. A conclusão, magistral, está no versículo 33:

“Qualquer de vós que igualmente, portanto, não renunciar a tudo o que possui, não pode ser meu discípulo” (Lucas 14,33).


Renuncia a tudo o que possui. O que você entende por isso? Será que não está incluído títulos, prêmios, vantagens, privilégios, autossuficiência, recursos extraordinários, dinheiro supérfluo, vida cômoda em detrimento da pobreza dos outros, burguesia, recursos a outras forças espirituais escusas, não cristãs, e tantas outras coisas parecidas. Se não renunciarmos a isso tudo, ou seja, se não confiarmos primeiramente em Deus, em nossas ações e procedimentos, vamos trabalhar sozinhos, feito bobos. 

É bem marcante a ordem dada a Lucas 9,1-6; “ Não leveis para a viagem nem bastão, nem alforje, nem pão, nem dinheiro, nem tenhais duas túnicas”. Os comentaristas dizem que isso era para que os apóstolos ficassem mais livres para agir, menos impedidos ou amarrados a coisas materiais. Hoje em dia é a mesma coisa: desimpedidos de tudo, a evangelização se torna mais eficaz, por não ser baseada em nossos meios, mas na força e na ação de Jesus Cristo. Deus nos fornece tudo o que nos for necessário.

Em Lucas 12,33-34 vemos uma realidade ainda maior: “Vendei vossos bens e dai esmola! Fazei bolsas que não fiquem velhas, um tesouro inesgotável nos céus, onde o ladrão não chega nem a traça rói. Pois onde está o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração”.

A riqueza, a avareza, o medo do desconhecido, que nos leva a acumular bens e a procurar viver uma vida mais complexa, em que abastecemos nossos estoques materiais, sociais, afetivos, humanos, mentais, espirituais, pode ser até uma idolatria, como fala Lucas 12,13-21;


“Tomai cuidado com todo tipo de ganância, porque mesmo que alguém tenha muitas coisas, a vida de  um homem não consiste na abundância de bens” (v.15). E Jesus diz ao homem que queria destruir seus celeiros para construir maiores: “Louco! Ainda nesta noite pedirão de volta a tua vida. E para quem ficará o que tu acumulaste?” (v.20). 

Ainda Colossenses 3,5: “Mortificai (...) a cobiça de possuir, que é uma espécie de idolatria”. E em Efésios 5,5: “O avarento – que é como um adorador de ídolos...”. Diz- nos também Eclesiastes 1,2; 2,21-23: “Vaidade das vaidades(...) tudo é vaidade(...)!”.

Quando morremos as pessoas da família se apossam do que tínhamos ou simplesmente jogam tudo fora, se ali não encontram coisas que rendam dinheiro. Quantas coisas acumuladas durante anos, e num instante vão para o lixo. Quantos pecados de ira, irritação, maledicência, inveja, apegos, avareza, fizemos para acumular essas coisas! Quanto tempo perdido! Num instante, deixam de existir. Quantas orações, caridade, atos de fé, prática da fé, sobriedade, amor verdadeiro e gratuito, lazer justo e necessário, férias, estudos, curtição dos filhos, do(a) esposo(a), dos filhos nós deixamos de lado para amontoarmos coisas inúteis!


São João Crisóstomo, entre os anos 349-407, fala sobre o fato de que muitas vezes gastamos fortunas em embelezar os templos e deixamos o outro morrer de fome (2ª leitura do sábado da 21ª semana do tempo comum, of. das leituras). Eis uma parte do texto: 


"Que proveito haveria, se a mesa de Cristo está coberta de taças de ouro e ele próprio morre de fome? Sacia primeiro o faminto e, depois, do que sobrar, adorna sua mesa. Fazes um cálice de ouro e não dás um copo de água? Que necessidade há de cobrir a mesa com véus tecidos de ouro, se não lhe concederes nem mesmo a coberta necessária? Que lucro haverá? Dize-me: se vês alguém que precisa de alimento e, deixando-o lá, vais rodear a mesa, de ouro, será que te agradecerá ou, ao contrário, se indignará? Que acontecerá se ao vê-lo coberto de andrajos e morto de frio, deixando de dar as vestes, mandas levantar colunas douradas, declarando fazê-lo em sua honra? Não se julgaria isto objeto de zombaria e extrema afronta?” 

Faço aqui um pequeno silêncio para refletir sobre os imensos gastos que se fazem com construções e acabamentos luxuosos de igrejas, salões e casas paroquiais, e a miséria que se empregam para favorecer a formação de líderes comunitários instruídos e formados nas ciências necessárias para um apostolado eficaz no meio do povo, sem falar ainda do abandono em que muitas famílias se encontram. Será que essas luxuosas construções estão agradando a Deus?

Quero ainda deixar uma palavrinha sobre a parafernália de coisas que tiram nossa atenção durante o dia. O Eremita de Jesus Misericordioso deve prestar atenção de não perder muito tempo com rádio, tv, de modo exagerado. O Pe. René Voillaume (morreu em 2003), disse que uma pessoa que fica horas a fio diante da TV, dificilmente terá disposição para rezar. E é isso mesmo! A TV, mais até que o rádio, nos toma muito mais tempo do que percebemos. Também provocam muitas vezes alguma superficialidade no modo de pensar e de julgar os acontecimentos e as coisas. 


Posso até arriscar dizer que somos o que vemos e ouvimos. Se formos fãs assíduos desses veículos de comunicação e não temos outras fontes de informação, vamos acabar pensando, mediocremente como eles. Conheço uma pessoa tão viciada em novelas que até nos velórios que vai pede para ver a novela numa vizinha do velório. É impressionante! 


Nós, eremitas de Jesus Misericordioso, devemos aprender a nos controlar diante dos meios de comunicação social e adquirirmos uma visão crítica em relação a eles. A propaganda que fazem de coisas supérfluas vai diretamente contra o que os cristãos devem pensar e desejar. 


Curtir o silêncio é muito importante para nossa vida espiritual. São Francisco de Salles dizia, já no século 16: “As pessoas se entopem de barulho para não ouvirem a voz de seu coração”. Há um artigo muito bonito neste blog sobre o silêncio e o deserto, do Dom Edson Damian, de S. Gabriel da Cachoeira. Deem uma lida e irão gostar! 


O silêncio e o despojamento: duas coisas muito evitadas, atualmente, por causarem insegurança e, ao mesmo tempo, uma tomada de atitude às vezes drástica diante da vida. Diz Oseias 2,16: “Vou levá-la ao deserto e aí lhe falarei ao coração (ou: vou conquistar seu coração)”. O deserto é o lugar da simplicidade conseguida no despojamento total e na solidão! 


O problema é aprendermos a fazer silêncio num mundo tão conturbado como este. O silêncio não deve ser apenas dos sons, mas dos ruídos internos, como das nossas fantasias. É muito difícil vencer e saber contornar as fantasias, mas com paciência, oração e jeitinho a gente consegue substituir as fantasias indesejáveis por pensamentos bons e santos. O segredo é não tentar abafar as más fantasias, mas substituí-las por outras boas e santas. 


O vazio que se faz ao nosso redor e no nosso interior, nós o preenchemos com a presença da graça de Deus! Maria é cheia de graça porque, em sua simplicidade, esvaziou-se do orgulho e de si mesma. (Lucas 1,47-48). Diz o Salmo 131(130): 


“Senhor, meu coração não é ambicioso(...). Eu fiz calar e repousar meus desejos” (silêncio interno).”Como criança desmamada no colo da mãe” (desmamada porque não procura mais o peito. Está no colo da mãe sem outra intenção que a de estar ali, no aconchego do colo, e não com o interesse de mamar!)




3 - - EPÍSTOLA DE BARNABÉ - O CAMINHO DA LUZ ! 


Na dita Epístola de Barnabé (2ª leit. 4ª f. 18ª sem. com.) vemos um resumo de como deve ser a vida do cristão católico:

- Amarás quem te criou;

- Terás veneração por quem te formou;

- Darás glória a Jesus, que te remiu da morte;

- Serás simples de coração e rico no espírito;

- Não te juntarás aos que andam pelo caminho da morte;

- Terás aversão por tudo quanto desagrada a Deus;
- Odiarás toda simulação;

- Não desprezes os mandamentos do Senhor;

- Não te exaltes a ti mesmo. Sê humilde em tudo!

- Não procures a tua glória;

- Não faças mau projeto contra o próximo;

- Não te entregues à arrogância;

- Ama teu próximo mais do que a tua vida;

- Não mates o feto por aborto nem depois do nascimento;

- Tem em mãos teu filho ou tua filha e desde criança ensina- lhes o temor do Senhor.

- Não cobices os bens do teu próximo, nem sejas avaro.

- Não te unas de coração aos soberbos, mas sê amigo dos - humildes e justos;

- Tanto quanto te acontece, recebe-os como um bem, - sabendo que nada se faz sem Deus;

- Não sejas inconstante e sem palavra;

- É laço de morte a língua dúplice;

- Partilharás tudo com o teu próximo e não dirás ser propriedade tua o que quer que seja.

- Se sois co-herdeiros das realidades incorruptíveis, quando mais sois co-herdeiros daquilo que se corrompe!

- Não sejas arrebatado de língua;

- A boca é cilada mortífera.

- Tanto quanto puderes, por tua alma sê casto;

- Não tenhas a mão estendida para recebe e encolhida para dar!

- Ama como à pupila dos olhos todo aquele que fala a Palavra do Senhor, guarda na memória, dia e noite, o dia do juízo e procura diariamente a presença dos santos, estimulando pela palavra, exortando e meditando como salvar a alma por tua palavra ou trabalhar com tuas mãos para a remissão dos pecados;

- Não hesites em dar, nem dês murmurando, pois bem sabes quem é o remunerador da dádiva;

- Guarda o que recebeste, sem tirar nem pôr; 

- Seja-te perpetuamente odioso o maligno;

- Julgarás com justiça;

- Não fomentes dissídios, mas esforça-te por restituir a paz, reconciliando os contendentes;

- Confessarás teus pecados. Não vás às orações com a consciência carregada. TAL É O CAMINHO DA LUZ!

O Livro do Eclesiástico 2,1-6, lembra que seremos provados no decorrer de nossa vida, mas devemos, com muita paciência, não nos separar de Deus, não ter pressa nos momentos das adversidades, e aceitar tudo o que nos acontecer, pois sabemos que Deus é misericordioso, é nosso Pai e nossa Mãe, e não vai nos deixar para trás. Termina no versículo 11: "Deus é compassivo, misericordioso, perdoa os teus pecados e te salva na tribulação".



4 - VIVER O DIA DE HOJE 
Um outro aspecto da simplicidade é viver o dia de hoje, o presente. Não se preocupar com o passado, que não mais dominamos, nem com o futuro, que desconhecemos porque ainda não existe, e depende de minhas decisões de agora. 

Santa Faustina Kowalska e uma legião de santos, incluindo o Papa João XXIII, cultivavam essa espiritualidade do "Só por hoje", aliás, muito utilizada na cura da dependência química. Eu acho magistral a interpretação que dá, a esse assunto, S. Paulo Apóstolo, em Efésios 4,17-24 e Filipenses 3,13-14.16: 

"(...) Não andeis(...) na futilidade dos vossos pensamentos, com entendimento entenebrecido, alienados da vida de Deus pela ignorância e pela dureza dos seus corações(...)"; 

"(Em Jesus) fostes ensinados a remover o vosso modo de vida anterior - o homem velho, que se corrompe ao sabor das concupiscências enganosas - e a renovar-vos pela transformação espiritual da vossa mente, e revesti-vos do Homem Novo, criado segundo Deus na justiça e na santidade da verdade." 

(Filipenses) "Esquecendo-me do que fica para trás e avançando para o que está diante, prossigo para o alvo, para o prêmio da vocação do alto, que vem de Deus em Cristo Jesus. Entretanto, qualquer que seja o ponto a que chegamos, conservemos o rumo!" 

É bom lembrar, aqui, que "esquecer" não é tirar da mente, mas sim, não se apegar ao passado, perdoar-se, sentir-se perdoado por Deus, não depender do passado para viver e ser feliz. Precisamos ter consciência de que podemos, sim, romper com tudo o que ainda estiver nos prendendo ao passado, que nos impede de prosseguirmos a caminhada. Diz Provérbios 23,26: 

"Meu filho, dá-me teu coração e que teus olhos gostem dos meus caminhos!" 

De fato, não dá certo recalcarmos o nosso passado, querer esquecê-lo: isso faz piorar as coisas. É preciso que aprendamos a assumi-lo e a superá-lo, mas sem nunca negá-lo. É da negação do passado que surgem os problemas psicológicos. Temos que enfrentar o que somos agora, pois somos o que preparamos pelo nosso passado. Como diz Jesus, colhemos o que plantamos. 

A simplicidade e pobreza de vida se refletem nesses atos de humildade, quando com muita sinceridade confirmamos o que realmente somos, mas, pedindo perdão dos nossos pecados, recomeçamos uma vida nova, nos braços do Pai/Mãe Deus. Aceitar os "estragos" do passado, repará-los, e viver apenas no presente, num presente em que nos realizamos como pessoa humana, cristã, como filhos de Deus. 

Aqui se aplica bem a simplicidade e a pobreza, no sentido de vivermos plenamente em Deus, numa dependência divina, ao contrário do que fez Adão e Eva e Lúcifer. Eles quiseram viver por si mesmos; nós queremos viver em Deus, com a ajuda de Deus, confiando em sua onipotência e misericórdia, em sua divina sabedoria que nada nos faltará, que estamos caminhando pelos seus caminhos. 

Maria, Mãe dos caminheiros, nos ajudará a "fazer tudo o que Jesus disser", nos ajudará a sermos, como ela, humildes servos e servas do Senhor,  


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